ARTIGO - O novo Código Eleitoral e a quarentena para a magistratura. Por Giuliano Máximo Martins e Frederico Mendes Junior

Rômulo Cardoso Quarta, 15 Setembro 2021

Encontra-se em curso no Congresso Nacional a discussão sobre o novo Código Eleitoral (Projeto de Lei Complementar - PLP nº 112/2021). Uma das regras mais polêmicas neste projeto de lei está no dispositivo que determina uma quarentena de 05 anos, depois de deixar a carreira, para que magistrados, membros do Ministério Público, militares e policiais militares possam concorrer às eleições.



A intenção inicial desta previsão tinha endereço certo: impedir que o ex-juiz Sérgio Moro fosse candidato nas próximas eleições. Ainda que calcada em uma ideologia maior de se conferir imparcialidade durante sua atuação profissional sem se deixar levar pelas intenções eleitoreiras, tal quarentena parte de um casuísmo e não se sustenta numa análise conglobante do ordenamento jurídico.

 

O Brasil seguiu a tradição europeia da separação de poderes. O Judiciário aqui não é eleito pelo povo. O ingresso na carreira se dá por rigoroso concurso de provas e títulos. A legitimidade dos comandos judiciais está na investidura pelo concurso e na necessidade de fundamentação de todas suas decisões, o que permite uma fiscalização interna daqueles que atuam no processo e externa, pela população em geral, dado que as decisões judiciais são públicas como regra.

 

Vale sublinhar, ainda, que os magistrados e magistradas de todo o país não podem ter qualquer atuação político-partidária. E, caso o magistrado deixe a carreira por aposentadoria ou por exoneração, já existe a regra de que deve ter um intervalo de 06 meses para poder se candidatar em outros cargos políticos.

 

A extensão desse prazo para cinco anos, além de trazer grave restrição ao juiz ou juíza que não está mais na carreira e que não mais se sujeita às rígidas regras de conduta da Lei Orgânica da Magistratura Nacional - LOMAN, compara-se a uma sanção e se mostra fortemente desproporcional. Tanto é que o indivíduo que é sancionado por improbidade administrativa, ou seja, infringiu gravemente a legislação no exercício da função, pode ter uma inelegibilidade de três anos a dez anos, quase a mesma que se está adotando no projeto do novo Código Eleitoral aos magistrados, que não cometeram ilegalidade alguma em se candidatar.

 

A distorção desta previsão legal fica ainda mais majorada quando o mesmo projeto de lei não coloca no dispositivo outras carreiras típicas de estado, cuja atuação é paralela à do magistrado ou membro do Ministério Público, como a Defensoria Pública, a Procuradoria do Estado, a Advocacia da União ou o Tribunal de Contas. Também não possuem tão elevada quarentena o servidor público em geral, mesmo que atue em cargos diretivos, incluindo professores e médicos.

 

Basilar estrutura da democracia é a participação popular através do voto, que justifica a representação dos eleitos em cargos dos Poderes Executivo e Legislativo. A completude no significado da participação popular não deixa dúvidas de sua imediata aplicação quando fundada na verdadeira premissa de que o poder emana do povo. Mas agora com uma ressalva interessante prevista no projeto de lei, se for juiz tem que curiosamente aguardar cinco anos.

 

É louvável que haja um aprimoramento da legislação eleitoral, que, a propósito, data de 1965. Todavia, devem ser afastadas as alterações casuísticas, cujo móvel esteja direcionado a atingir determinados indivíduos ou interesses. O interesse público deve ser apartidário, voltado à sociedade como um todo.

 

Giuliano Máximo Martins (*) - Juiz de Direito e Presidente da AMAMSUL - Associação dos Magistrados de Mato Grosso do Sul


Frederico Mendes Junior (*) - Juiz de Direito e Coordenador da Justiça Estadual da AMB - Associação dos Magistrados Brasileiros

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