Juiz que julgou conflito entre irmãos por causa de moletom comenta à AMAPAR o uso predatório da Justiça
Rômulo Cardoso Quarta, 29 Maio 2019
Um moletom preto, tamanho P, mangas com estampa de caveiras, motivou a briga de uma irmã e um irmão e o consequente ajuizamento de ação nos Juizados Especiais de Cascavel, região Oeste do Paraná.
O responsável por dar desfecho ao conflito e sentenciar que o irmão entregasse a peça de roupa à irmã foi o juiz Rosaldo Elias Pacagnan. Na sentença, o magistrado determinou que ocorresse a entrega da blusa, comprada pela irmã e usada pelo irmão, em 24 horas “em perfeito estado” ou o equivalente em dinheiro (R$ 79,99).
Ao comentar à AMAPAR a disputa judicial de um moletom, entre irmãos que residem na mesma casa, o juiz Rosaldo Pacagnan ressalta que o caso exemplifica bem o fenômeno da “judicialização da vida”, ao denotar uma postura bastante intolerante, impaciente e egoísta de boa parte da sociedade.
“Também uma indisposição de dialogar com o próximo, com o seu concidadão e tentar por vias pacíficas solucionar esses conflitos que surgem”, disse.
O magistrado afirma que tais processos, na maioria de competência dos Juizados Especiais, mostram que cada vez mais as pessoas estão se sentido incapazes, ou simplesmente não querem se dar ao trabalho e transferem a responsabilidade de pacificação, de acerto e resolução para o Judiciário. “Tudo passa a ser motivo para mover uma ação”, conclui.
Em muitas situações, como bem lembra o magistrado, o Judiciário serve, descabidamente, de instrumento para “incomodar” o outro. “O Judiciário não pode, jamais, ser utilizado como uma ferramenta para legitimar o ódio e sentimentos de vingança”, comenta.
SOBRE O CASO
Os irmãos que disputaram o moletom – de mangas de caveira - residem na mesma casa, em Cascavel. Na sentença, o juiz Rosaldo Pacagnan explicou que a irmã provou ‘que comprou um blusão de moletom com seu cartão de crédito, pela internet’. Ela teria colocado a compra no nome da mãe ‘para facilitar a entrega pelos Correios’. O irmão abriu a caixa da encomenda, viu, gostou e pegou a blusa e não quer mais devolver. “Essa é a disputa trazida ao Judiciário!”, pontuou o magistrado.
Rosaldo Elias Pacagnan destacou que não houve consenso na audiência de conciliação e na oportunidade o irmão estava vestido com o moletom. “Não seria de duvidar se ele o fizesse, dado que numa coisa tão simples e banal, tais pessoas adultas, que deveriam se amar e respeitar, conseguem a proeza de continuar brigando por uma peça de roupa. Onde é que esse mundo vai parar?”, questionou o magistrado.
O juiz ponderou que se a blusa fosse da mãe, na esfera penal o irmão estaria isento de pena pela apropriação indébita ou furto. “Mas como é da irmã, até crime, em tese, isso é (deixando de lado o princípio da insignificância, porque a roupa custou R$ 79,99). Só que para além de conceitos jurídicos, é coisa feia o que está acontecendo… E feia para os dois lados”, afirmou.
“Será que se o moletom não aparecer teremos que chegar ao cúmulo de mandar um Oficial de Justiça procurá-lo com mandado de busca e apreensão? É o ódio, a insensatez ou a birra sendo mais forte que os laços de sangue, e, em igual medida, a indisposição para perdoar, tolerar, suportar o dano no ambiente doméstico. Fazer o quê? Aplicar o direito onde o amor deveria ter resolvido”.