Juiz no Paraná, Eduardo Fagundes Bueno Júnior emprestará sua experiência em mutirão no sistema penitenciário paraense

Rômulo Cardoso Quinta, 31 Julho 2014

Juiz no Paraná, Eduardo Fagundes Bueno Júnior emprestará sua experiência em mutirão no sistema penitenciário paraense

O estado do Pará, região Norte do país, será o destino de trabalho, durante o mês de agosto, para o juiz Eduardo Lino Fagundes Bueno. Com a experiência de ter realizado, desde o ano de 2011, mais de 30 mutirões carcerários no Paraná, quando passou a atuar na 1ª vara de execuções penais de Curitiba, Eduardo será colaborador no comitê do Conselho Nacional Justiça (CNJ) que avaliará o sistema penitenciário paraense. “No Pará, ficarei 30 dias e depois terei uma semana para elaboração do relatório de trabalho. Como mudanças, tentaremos fazer uma verdadeira cooperação entre CNJ e Estado, para que o mutirão carcerário seja uma ferramenta de transformação e não algo repressivo”, conta o juiz.

Antes de embarcar na missão, o magistrado teceu algumas considerações sobre o trabalho destacável realizado no Paraná, frente à vara de execuções penais de Curitiba, além de criticar a falta de estrutura para a ressocialização de presos. “O ideal seria restringir a prisão para casos extremamente essenciais com acompanhamento efetivo dos presos, dando trabalho, estudo e amparo psicológico, assim evitaríamos o elevado índice de reincidência”, comenta.

Confira a entrevista.

Dr. Eduardo, como surgiu o convite para colaborar no mutirão organizado pelo CNJ que será realizado no mês de agosto, no distante estado do Pará?

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ), durante essa fase de transição, tem alterado um pouco o funcionamento dos mutirões carcerários e passou a convidar juízes de outros estados para que conduzam todo o processo. No Pará, ficarei 30 dias e depois terei uma semana para elaboração do relatório de trabalho. Como mudanças, tentaremos fazer uma verdadeira cooperação entre CNJ e Estado, para que o mutirão carcerário seja uma ferramenta de transformação e não algo repressivo. Problemas no Pará serão identificados e também serão encaminhadas soluções, além das boas práticas adotadas, para que sirvam de incentivo.

O senhor tem algum levantamento prévio sobre os problemas no sistema carcerário do Pará?

Na execução penal, como o volume de presos é muito grande, obrigatoriamente as varas têm que ser informatizadas, mesmo porque existe lei específica determinando que o juiz tenha controle total sobre as datas da progressão de regime, de livramento condicional, comutação e indulto. No Paraná, adotamos esse sistema, mas, no Pará, ainda estão dando os primeiros passos na informatização. Lá, ainda existem presos em que o Judiciário não emite o atestado de pena, onde estão as datas da progressão de regime. Vamos levantar todas as situações e dar encaminhamento para efetivar a informatização do sistema carcerário do Pará, além de visitar presídios e obras em andamento, pois o Pará pretende criar mais seis mil vagas no sistema.

Aqui no Paraná o senhor atuou em mais de 30 mutirões. Quais os principais resultados alcançados, desde 2011, quando o senhor começou a trabalhar no levantamento da situação de execução das penas?

Com os mutirões carcerários realizados no Paraná conseguimos colocar absolutamente em dia o direito das pessoas presas. Antigamente, quando a pessoa tinha direito à progressão de regime, precisava aguardar que a Defensoria Pública provocasse o início do procedimento, depois seria levado ao Ministério Público, com juntada de documentos e esse processo era muito longo. Nos mutirões julgamos todo o estoque e começamos a agir de ofício, ou seja, o próprio juiz percebe que a pessoa tem determinado direito. Os números mostram. Em 2011, o Paraná possuía mais de 30 mil presos e era o terceiro estado com maior número de presos. Diminuímos, hoje estamos com 28 mil e passamos a figurar na quarta posição.

Doutor, o Brasil é o terceiro país com mais presos no mundo, sendo mais de 700 mil, entre provisórios e definitivos. A Organização das Nações Unidas (ONU) também critica a situação, ao observar que no país não é levada em consideração a presunção de inocência, preceito constitucional. Sem entrar na pergunta recorrente sobre qual seria a solução definitiva, ou eficaz, para o sistema penitenciário brasileiro, mas, quais são os grandes calos do sistema?

Essa é uma questão que passa por todos os responsáveis - Poderes Judiciário, Executivo e Legislativo. A prisão deve ser reservada para casos extremos, pois é a sanção mais grave no mundo e não podemos aplicar a prisão indiscriminadamente. O Poder Judiciário tem que chamar para si o controle de entrada no sistema carcerário. Assim que o Executivo via Polícia Civil ou Polícia Militar prende alguém, o Judiciário imediatamente deve verificar a legalidade daquela prisão e analisar se existe outra medida cabível. Sempre que for possível qualquer outra medida, deve ser evitada a prisão para que não aconteçam essas situações como a de uma pessoa sair do sistema carcerário pior do que entrou.

O sistema progressivo de pena, onde a pessoa ganha gradativamente a confiança, deve servir para que ela melhore com o passar do tempo, trabalhando e estudando, enfim, para que aprenda a viver em sociedade até ser solta. Mas, hoje, com a prisão em massa, os estados não conseguem prover educação e trabalho para essas pessoas e elas saem, assim, pior do que entraram. Muitas vezes, perdemos as pessoas para as facções criminosas. O ideal seria restringir a prisão para casos extremamente essenciais com acompanhamento efetivo dos presos, dando trabalho, estudo e amparo psicológico, assim evitaríamos o elevado índice de reincidência. Não adianta deixar a pessoa presa, amontoada, depois abrir a porta e dizer a ela que é hora de ir embora, sem qualquer assistência.  

A redução passa por um controle da porta de entrada no sistema, um controle absoluto na porta de saída e, nesse período em que as pessoas que realmente tiverem que ficar encarceradas, que elas sejam aproveitadas. É um absurdo uma pessoa presa, analfabeta, ficar 10 anos no sistema e sair analfabeta. Não existe aproveitamento para a sociedade, pois o sistema é caríssimo. Os nossos presídios também são muito antigos. Hoje, na casa de custódia de Piraquara, por exemplo, com mais de 1600 pessoas, existem apenas 30 vagas de trabalho. A pena tem o caráter de retribuição pelo crime cometido, mas tem o caráter de ressocialização.

Para o senhor, como magistrado, qual é a satisfação em colaborar na revisão e execução das penas, aliada à reação dos presos que possuem o direito à liberdade ou à progressão de regime?

O mutirão carcerário é muito mais do que somente uma avaliação, pois fazemos o trabalho dentro dos presídios e a realidade começa a mudar, pois a penitenciária não fica esquecida. A Colônia Penal Agrícola, hoje, está sempre com a grama cortada, alojamentos limpos, ou seja, outro panorama. É muito importante, além de olhar a situação dos presos, observar também a situação dos presídios. A importância de o juiz conhecer a figura humana é muito importante, também. Conseguimos enxergar a realidade e ver como a juventude está passando pelo sistema penitenciário com muita facilidade, principalmente pelo problema das drogas.

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