AMAPAR emite nota pública em face de declarações divulgadas em rede social pelo prefeito de Rio Branco do Sul
Rômulo Cardoso Segunda, 27 Julho 2015
NOTA PÚBLICA
A ASSOCIAÇÃO DOS MAGISTRADOS DO PARANÁ – AMAPAR -, entidade que congrega os juízes e desembargadores ativos e inativos do Estado do Paraná, diante das recentes manifestações apresentadas pelo Prefeito de Rio Branco do Sul, senhor Cezar Gibran Johnsson, em sua página pessoal do facebook (https://www.facebook.com/cgj.adv?fref=ts), contra a figura do Juiz de Direito Titular da Vara da Fazenda Pública de Rio Branco, doutor Marcelo Teixeira Augusto, contendo insinuações maldosas questionando a retidão e a capacidade profissional do magistrado, vem a público esclarecer os fatos:
1 – O Ministério Público do Paraná, visando à proteção do patrimônio público, no exercício de sua função constitucional (art. 129, inciso II, da Constituição da República[1]), ajuizou, recentemente, na Comarca de Rio Branco, 43 (quarenta e três) ações de improbidade administrativa, nas quais cerca de 80 (oitenta) pessoas são acusadas de desvio de dinheiro público (algo perto de 17 milhões, segundo o Ministério Público). O Prefeito do Rio Branco, senhor Cezar Gibran Johnsson, é réu em 09 ações de improbidade administrativa.
2 – Durante o curso de alguns dos processos citados, com base em farta prova documental e asseguramento das garantias do contraditório e da ampla defesa, o magistrado Marcelo Teixeira Augusto, mediante decisões devidamente fundamentadas, determinou a indisponibilidade de bens do Prefeito.
3 – O magistrado, portanto, agindo com base na garantia constitucional da independência funcional que lhe é ofertada pela Constituição Federal, dentro, inclusive, da perspectiva da prudência assinalada pelo Código de Ética da Magistratura[2] (Aprovado na 68ª Sessão Ordinária do Conselho Nacional de Justiça, do dia 06 de agosto de 2008, nos autos do Processo nº 200820000007337), objetivando acautelar os interesses da coletividade, determinou medida cautelar restritiva de cunho patrimonial.
4 – É certo que o princípio da presunção de inocência ou de não culpabilidade – o qual, atualmente, não é dirigido apenas à seara criminal – traduz regra indicativa de que o cidadão não pode ser considerado culpado até o trânsito em julgado. Não menos certo também é que, ao Estado-Juiz, são disponibilizados, pelo legislador, instrumentos cautelares de caráter restritivo que podem ser usados em desfavor de investigados ou réus.
5 – A postura judicial decisória adotada pelo magistrado foi devidamente e exaustivamente fundamentada, conforme exigência normativa prevista no inciso IX do artigo 93 da Constituição Federal de 1988[3]. E encontra base, dentre outros, no artigo 7° da Lei 8.429/92[4].
6 – Diante da gravidade da restrição que toda e qualquer medida de indisponibilidade pode provocar, é natural que haja descontentamento por parte da pessoa por ela atingida. Todavia, a insurgência frente ao quanto decidido em processo judicial público, conduzido por presentante do Estado-Juiz investido na jurisdição após aprovação em concurso de provas e títulos, deve ser operacionalizada mediante o competente mecanismo processual do recurso. Toda e qualquer decisão judicial - repise-se - pode ser questionada por meio de recurso aforado pela parte descontente.
7 – Vê-se, por consequência, ser desmedida a manifestação apresentada pelo senhor Cezar Gibran Johnsson, colocando em dúvida a idoneidade, a imparcialidade do magistrado e sua capacidade profissional. A propósito, em suas recentes declarações veiculadas na página do facebook, chega a dizer que o Juiz teria sido afastado das ações em que é réu por possuir interesse pessoal, bem assim que teria sido reconhecida a sua imparcialidade para atuar e julgar os casos, dando a entender que outro órgão julgador (Tribunal de Justiça) o teria afastado do processo.
8 – As declarações não correspondem à verdade dos fatos e merecem a devida e respeitosa retificação. A bem da verdade, a decisão de se afastar dos processos foi tomada por ato do próprio julgador. Não houve afastamento por outro órgão do Judiciário.
9 – O Código de Processo Civil, no artigo 304, diz ser lícito a qualquer das partes arguir, por meio de exceção, a incompetência, o impedimento ou a suspeição do juiz. Tal procedimento fora ajuizado pelo Prefeito de Rio Branco, conforme se pode extrair de consulta pública aos autos n° 0003656-66.2015.8.16.0147.
10 – No bojo da citada exceção de suspeição, o próprio Juiz, com base no art. 313 do Código de Processo Civil[5], após esclarecer que, até o presente momento, estava conduzindo os processos em que o excipiente Cezar Gibran Johnsson figurava como parte interessada com a imparcialidade que a lei exige de todo e qualquer magistrado, diante de episódios recentíssimos que não mereciam ser detalhados, ocorridos logo após a publicação das últimas decisões judiciais proferidas nas diversas ações civis públicas de improbidade administrativa que tramitam na Vara, fizeram surgir uma animosidade que antes não havia, situação que poderia, sem dúvida, influenciar as futuras decisões que o julgador teria ainda de proferir nas causas onde Cezar Gibran Johnsson é parte interessada. Pontuou jamais ser de seu feitio, como julgador, utilizar a prestação jurisdicional para satisfazer pretensões ou sentimentos de cunho pessoal, considerando não ser recomendável, inclusive como forma de preservação da credibilidade das futuras decisões judiciais a ser proferidas e da imagem do Poder Judiciário local, a permanência na presidência dos processos onde o excipiente Cezar Gibran Johnsson figura como parte.
11 – Vê-se, por corolário, que o afastamento não ocorrera por ato de terceiro, mas, sim, por ato próprio do julgador, que, lastreado no Código de Processo Civil, ordenou a remessa dos autos ao seu substituto legal, considerando que atos posteriores aos julgamentos por ele exarados, estavam a exigir, a fim de preservar a imagem da Justiça, o seu afastamento.
12 – As declarações e insinuações infundadas do senhor Prefeito não só atingem, de forma indevida, à imagem do magistrado, mas também ao Poder Judiciário Paranaense como um todo, merecendo, por consequência, repudio imediato.
13 – Não se está a tolher ou mitigar uma das mais antigas e importantes garantias constitucionais, qual seja, a liberdade de manifestação do pensamento (art. 5°, IV, CF/88). Em absoluto. Tampouco se está a censurar o direito de crítica às decisões judiciais. Fato é que, no Estado Democrático de Direito, assentado sobre um sistema de proteção de direitos fundamentais, não há direito absoluto. O direito de crítica, no caso, extrapolou o âmbito da mera manifestação do pensamento, desbordando para ato ilícito que viola à imagem do magistrado e do Judiciário Paranaense.
14 – No Estado Democrático de Direito, não se concebe possam as decisões judicias ser questionadas senão pelas vias processuais adequadas (recursos) previstas no Código de Processo Civil – o que não ocorre no caso em comento. Eventual descontentamento com a decisão do magistrado deve ser levantado pela parte autora da ação, caso assim queira, por meio do mecanismo processual correto.
15 - O Poder Judiciário, para além da função clássica de aplicador da lei, atua como instrumento de garantia dos direitos fundamentais. Toda e qualquer crítica desmedida e arbitrária aos seus presentantes, Juízes, atinge por inteiro a instituição e, por consequência, os próprios usuários do serviço essencial da justiça. Atingem, em última análise, o próprio Estado Democrático de Direito.
16 – Vai daí que a presente mensagem serve apenas a esclarecer os fatos e a contribuir para o fortalecimento da Democracia com a consequente aproximação do Poder Judiciário e sociedade.
17 – Para finalizar, os magistrados do Paraná vêm a público apresentar integral e incondicional apoio à conduta adotada pelo Juiz de Direito Marcelo Teixeira Augusto, em exercício na Comarca de Rio Branco do Sul-PR, o qual, em decisão fundamentada na Constituição Federal, no Código de Processo Civil e na Lei de Improbidade Administrativa, em processos judiciais públicos, com a participação do Ministério Público, cumpriu seu papel constitucional.
18 – As medidas judiciais necessárias para coibir o abuso aos direitos de crítica e liberdade de expressão que respinguem na imagem do Poder Judiciário Paranaense serão tomadas, com rigor, pela assessoria jurídica da Associação dos Magistrados.
Curitiba, 27 de julho de 2015
FREDERICO MENDES JUNIOR
Presidente da Associação dos Magistrados do Paraná
[1] Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:
(...)
III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos;
[2] Art. 1°. O exercício da magistratura exige conduta compatível com os preceitos deste Código e do Estatuto da Magistratura, norteando-se pelos princípios da independência, da imparcialidade, do conhecimento e capacitação, da cortesia, da transparência, do segredo profissional, da prudência, da diligência, da integridade profissional e pessoal, da dignidade, da honra e do decoro. Art. 24. O magistrado prudente é o que busca adotar comportamentos e decisões que sejam o resultado de juízo justificado racionalmente, após haver meditado e valorado os argumentos e contra-argumentos disponíveis, à luz do Direito aplicável. Art. 25. Especialmente ao proferir decisões, incumbe ao magistrado atuar de forma cautelosa, atento às consequências que pode provocar. Art. 26.. O magistrado deve manter atitude aberta e paciente para receber argumentos ou críticas lançadas de forma cortês e respeitosa, podendo confirmar ou retificar posições anteriormente assumidas no processo em que atua.
[3] IX – todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo prejudique o interesse público à informação (Redação dada pela Emenda Constitucional n° 45, de 2004).
[4] Art. 7° Quando o ato de improbidade causar lesão ao patrimônio público ou ensejar enriquecimento ilícito, caberá a autoridade administrativa responsável pelo inquérito representar ao Ministério Público, para a indisponibilidade dos bens do indiciado. Parágrafo único. A indisponibilidade a que se refere o caput deste artigo recairá sobre bens que assegurem o integral ressarcimento do dano, ou sobre o acréscimo patrimonial resultante do enriquecimento ilícito.
[5] Art. 313. Despachando a petição, o juiz, se reconhecer o impedimento ou a suspeição, ordenará a remessa dos autos ao seu substituto legal; em caso contrário, dentro de 10 (dez) dias, dará as suas razões, acompanhadas de documentos e de rol de testemunhas, se houver, ordenando a remessa dos autos ao tribunal.